quinta-feira, 24 de maio de 2012

Cuba por Korda



"Cuba por Korda" é o nome de um livro que mostra o olhar de Alberto Korda, um dos maiores fotógrafos cubanos de todos os tempos. Sim, é dele a famosa foto de Che Guevara. Korda iniciou sua carreira como fotógrafo de moda, mas no final dos anos 50 passou a acompanhar Fidel Castro e Che Guevara, ainda na época da guerrilha, pelas altitudes da Sierra Maestra. Ele foi, durante anos, o fotógrafo pessoal, e não o oficial, de Fidel Castro.

Neste livro ele vai contando, passo-a-passo e através de suas imagens, uma história fascinante que, confesso, não conhecia. Eu me abstenho de dar opiniões sobre o sucesso ou fracasso do regime tão peculiar daquele país, mas sua história merece respeito e seu líder merece respeito.

Veja como Korda descreve a transição de seu foco de trabalho:
“Eu optara por uma vida frívola quando, por volta dos trinta anos, um acontecimento excepcional transformou minha vida: a Revolução. Foi então que tirei esta foto, de uma garotinha abraçada a um pedaço de madeira, em substituição à boneca que não tinha. Percebi que valia a pena dedicar um trabalho à revolução que propunha a supressão de tais desigualdades.”


E esta Revolução começou de um jeito surpreendente. Em novembro de 1956 um barco com 82 homens, liderado por Fidel Castro, saiu do México. Estava à bordo o médico argentino Ernesto Guevara. Após enfrentar tempestades e avarias, o barco encalhou no sudeste de Cuba e o pequeno grupo de rebeldes foi logo encontrado pelo exército do ditador Batista e dizimado. Os poucos sobreviventes se dispersaram e com Fidel Castro ficaram apenas dois homens (Che formou outro grupo). Em pequenos grupos separados, os sobreviventes, com ajuda dos camponeses da região, dirigiram-se ao maciço de Sierra Maestra.

Poucos dias depois Raul Castro se juntou ao irmão, com mais cinco homens, e Fidel perguntou: “Quantos fuzis você tem?”. Ao saber que havia cinco fuzis disponíveis, exclamou com o otimismo da determinação que o caracteriza: “Com os meus temos sete. Ganhamos a guerra!”.

A guerra era contra a ditadura imposta por Fulgêncio Batista, desde março de 1952, quando tomara o poder por meio de um golpe sangrento, com o apoio da alta burguesia latifundiária e dos Estados Unidos. Foi então que um jovem advogado, Fidel Castro, voltou-se para a luta armada.

Seria interessante contar, apenas com base no relato de Korda, quantas vezes Fidel Castro “escapou” da morte. Situações em que seu grupo foi capturado, mas ele conseguiu fugir, ou quando ele mesmo foi capturado, mas recebeu algum tipo de intervenção para não ser executado, ou mais tarde, já no poder, tendo sofrido atentados e tentativas de envenenamento. Sorte? Talento? Astúcia? Proteção divina?! Karma?!

De qualquer forma, não era fácil acompanhá-lo. Mas mais do que habilidades técnicas, era preciso garra e coragem. Veja como Korda junta-se ao grupo:

“Era preciso um fotógrafo capaz também de redigir um artigo. Fidel me perguntou se eu já havia escrito. Disse que sim, uma enorme mentira, mas por nada no mundo eu perderia aquela expedição...”

E conforme ia acompanhando o comandante, Korda presenciava cenas assim:

“Durante vários dias, caminhamos de um lugar chamado Las Mercedes até o pico Turquino. No caminho, Fidel falava com cada camponês com quem cruzávamos, passava-lhe o braço em torno dos ombros. Um pedia vacinas para seus porcos, outro, um professor suplementar para a escola. A cada vez, voltava-se a mim e dizia: `Tome nota...´”

A força física de Fidel também é muito citada no relato de Korda e ele conta que quando seus companheiros queriam que ele andasse mais lentamente, o faziam montar no dorso de uma mula.

Essa força, aliada ao talento para liderar, formaram o grande revolucionário. Korda conta que todos os dias, qualquer que fosse a extensão da marcha, Castro explicava para os companheiros “o que tinha acontecido naquele dia, nossos problemas e os problemas do inimigo. Desta maneira os homens ficavam perfeitamente a par de tudo o que se passava e devotavam um extraordinário respeito a seu comandante”.

No início de 1957, Fidel Castro, em uma atitude ousada, recebeu nas montanhas um repórter do New York Times. Veja só o que esse jornalista escreveu:

“É fácil ver porque seus homens o adoram e porque ele mexeu com a imaginação da juventude na ilha. É um fanático instruído e devotado à sua causa, um idealista repleto de coragem com notáveis qualidades de chefe.”

Na descrição de Fidel ainda consta menção à sua memória, ressaltando que ele se lembrava do nome de cada um e de todos os caminhos e que seria até capaz de citar livros inteiros!

E sob o comando desse ser humano notável foi caminhando, literalmente, a revolução. Por onde passavam, os rebeldes instalavam escolas e hospitais, esses liderados por Che Guevara, que tinha 29 anos e a mais alta estima do comandante.

Em pouco mais de um ano a guerrilha contava com 200 homens e foi deixando de ser nômade. Por essa época, uma mulher, Celia Sanchez, passa a fazer parte do grupo.

“Aos 36 anos, essa mulher, feita de determinação e inteligência, procurava uma tarefa à sua altura. Dali em diante, dedicar-se-ia, no limite de suas forças, à causa de Fidel Castro. Fascinada, ao mesmo tempo, pelo homem e pelo revolucionário, nem as marchas forçadas nem as bombas a impediriam de segui-lo como uma sombra, na luta e nos sonhos. Igualmente treinada no manuseio das armas, Celia tornou-se a primeira mulher a combater entre os guerrilheiros (...). Era a única com poderes de dar ordens na ausência do líder máximo. A única, por razões de segurança, a saber onde Fidel dormiria. Passava cada noite recuperando, nos bolsos da jaqueta militar verde-oliva, pequenos pedaços de papel: as ideias que o revolucionário rabiscara durante o dia, e que seria preciso colocar em prática.”


Com dois anos de guerrilha, o poder foi tomado em 2 de janeiro de 1959. Dois anos após um desastrado desembarque, com um exército de menos de 10 homens.

O relato de Korda estende-se até 1967, quando Che Guevara foi morto pelo exército boliviano. Desde 1965 Che havia saído de Cuba, como que concluindo sua missão naquele país, para continuar em sua luta pela liberação dos países latino-americanos.

Vale a pena conhecer também o início da gestão de Fidel Castro no poder cubano. A forma com que ele rompeu com os Estados Unidos e as consequências que sofreu por isso. A atenção que ele dispensou aos camponeses e à região erma que o abrigara durante a guerrilha. A força-tarefa que empreendeu para alfabetizar a população. As emboscadas da CIA. A relação com a Rússia. O apoio incondicional do povo cubano.

E, claro, as fotos de Korda! Lembre-se que ele era o fotógrafo pessoal de Fidel e, portanto, acompanhava os momentos de diversão (sim, guerrilheiros revolucionários divertem-se!), de descontração, os bastidores, que mostram os homens – Che e Fidel – que formaram os mitos.

Muita coisa passou pela minha cabeça enquanto lia esse livro e via essas imagens tão fortes. Tanta coisa que não consigo nem escrever sobre elas... principalmente por não querer tocar em polêmicas que acabam caindo em discursos vazios. Tem muita coisa pra gente aprender com essa história...

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