terça-feira, 26 de outubro de 2010

Você rouba?

"Ah, só um pouquinho, só de vez em quando..."

O que é "um pouquinho"? O que é "de vez em quando"? O que você diria a uma pessoa que desse essa resposta?

E se a resposta fosse mais contundente: "Sim, eu roubo", qual seria a sua reação? Será que essa pessoa é cleptomaníaca? Ou será que é um desonesto convicto? Eu diria que é apenas sincera...

É minha gente, é duro admitir, mas sim, eu tenho roubado. E não pense que vou descambar para algo do tipo: "eu roubo um beijo, eu roubo uma flor para o meu amor". Eu roubo dinheiro mesmo. E roubo de você, inclusive. Que feio, que triste... eu não quero mais fazer isso.

Deixa eu explicar, pelo menos. Desde que comecei a trabalhar como profissional autônoma, não tenho mais meus impostos retidos na fonte. Quando eu era assalariada era muito fácil, pois já vinha tudo descontado e no final eu ainda ganhava uma boa restituição de Imposto de Renda, então ficava aquele sentimento de que estava "saindo no lucro".

Mas agora quem controla o pagamento dos impostos sou eu e em muitos casos faço trabalhos para clientes que não pedem nota fiscal, pois o valor dos tributos é repassado para eles. Quando a pessoa não "precisa" da nota, ela acaba ganhando esse desconto referente aos impostos, que é de 17% no caso da minha empresa. Bom, que o valor dos impostos é repassado para o cliente/consumidor, não é novidade nenhuma, vide a Nota Fiscal Paulista, que reembolsa parte dos impostos para o consumidor. Mas por outro lado, é obrigação do prestador de serviço/comerciante emitir nota fiscal.

(Você está achando isso um absurdo? Eu sonegar impostos? Ou está pensando que é uma coisa que "todo mundo faz"? Pois saiba que é sim uma coisa que "todo mundo faz", mas claro que isso não justifica que eu ou você façamos também)

Enfim, essa ficha me caiu (como uma bomba) só agora, talvez por conta da época de eleições e do recorrente assunto da corrupção no Brasil. Eu fiquei em estado de choque quando senti na pele o quanto eu sou desonesta, corrupta e ladra. Eu não vejo diferença nenhuma entre um político que desvia verbas e uma pessoa que não paga seus impostos. E não me venha com "ah, mas Fulano desviou milhões de reais", ou "mas o político tal comprou uma mansão com o dinheiro que dava pra construir não sei quantos hospitais e escolas". Caímos de novo na questão de "o que é pouco?", "o que é muito?". Roubar um Real pode? E dez? E mil? Ah, mas um milhão não pode...

E se você disser que "não vou pagar imposto pra ir pro bolso de político corrupto", juro que se fosse pessoalmente eu ia ter que invocar todas as técnicas milenares do yôga, e outras mais que trago na minha bagagem, para não pular no seu pescoço! (mas mesmo assim pense muito bem antes de falar uma asneira dessa, porque entre as tais técnicas na bagagem tem alguns meses de Boxe Tailandês, rs...).

O que o "político" vai fazer com a verba que tem na mão é problema dele. Ele foi eleito por um sistema democrático, ele representa uma maioria que confia nele. Claro que isso não é garantia de que tudo será um mar de rosas, e realmente o mar está mais pra lama do que rosas... mas também não é justificativa para que você se corrompa também! Senão, onde vamos parar?

Não tem nada mais gratificante e tranquilizador do que a sensação de "eu fiz a minha parte". Nem sempre nos damos conta de qual é a nossa parte, mas ir tomando consciência disso é o caminho da evolução. E conforme sua consciência vai ampliando, a "sua parte" aumenta na mesma proporção. Eu costumo dizer que a ignorância redime. Dizer "eu não sabia" pode ser uma ótima desculpa, mas a partir do momento em que você sabe, aí já não tem mais jeito.

Mas tome muito cuidado com a redenção da ignorância, porque ela é traiçoeira. É melhor a gente se antecipar e saber, conhecer, do que esperar que o "eu não sabia" nos livre das consequências. Se você "não sabia" que no rio tinha piranhas, não é isso que vai fazer com que elas não o comam...

PS - eu não vou pedir desculpas pelo tanto que já roubei, porque isso não passaria de blá, blá, blá. Eu vou é ser extremamente rigorosa com a minha prestação de contas a partir de hoje. E vou pensar numa forma de ressarcir a sociedade... ainda não sei qual, mas assim que souber conto pra você. Aceito sugestões ;)

13 comentários:

  1. oi Carol!

    É isso mesmo. Esse é o grande problema do Brasil: a pequena corrupção faz parte da cultura do brasileiro. Pra tudo tem um jeitinho, aquela historia...

    Outra coisa grave são as empresas que operam em São Paulo mas são registradas em cidadezinhas do interior pra pagar menos impostos. "Coisa que todo mundo faz" - e que é um absurdo. Porque esse dinheiro com certeza vai para políticos corruptos que fomentam esses paraísos fiscais...

    bj e boa sorte!

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  2. É Leo, tem muita coisa pra consertar...

    A gente segue caminhando, tropeçando, levantando... e prestando mais atenção!

    Bjo!

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  3. Flor, corajoso e muito honesto! Serviu de lição para mim também, vem muita reflexão boa a partir desse texto!
    beijos orgulhosos!
    Carol

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  4. Então, aquele lance de comprar coisas sem nota... ichi... sou muito ladrão tb!

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  5. Flor, obrigada!

    Otávio, essa coisa da nota fiscal realmente acaba meio que "passando batido". Quando a gente compra sem nota fiscal está incentivando/acobertando a sonegação de impostos...

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  6. Oi Carol, Parabéns pelo texto, ha algum tempo tenho percebido grandes mudanças em você, e uma vontade sólida de buscar a sua verdade, e estou te admirando muito por isso.
    Gostei também do texto porque ele me lembrou um pouco do Osho, e porque me fez pensar.
    Essa maturidade, essa vontade inabalável de você seguir o que você acredita, até as últimas conseqüências, deixando o egoísmo de lado, seguindo a sua verdade. Isso me lembra muito o modo de vida do Osho e seus ensinamentos. Me lembrei de uma história onde ele, um certo dia, percebeu que era uma escolha dele confiar ou não nas pessoas, e ele percebeu que confiando incondicionalmente nas pessoas, o mundo, para ele, era uma lugar muito melhor de se viver. E ele confiava... Veja bem, da mesma maneira que não importa o que um político corrupto irá fazer com o dinheiro dos impostos, também não importa se alguém vai trair sua confiança... esta é uma qualidade sua. Não houve uma barganha, você não faz algo que me desagrade e eu confio em você, foi uma escolha consciente, madura e inabalável, EU CONFIO, em você, em todos, na vida...

    Agora, a parte que me fez pensar... bem, não tenho conclusões aqui, só gostaria de revirar um pouco as coisas... Eu expandi um pouco o seu conceito de “eu roubo” e ví que ele não para nos impostos. E as musicas que ouvimos sem pagar royalties? E o software que usamos sem ter comprado? E os produtos chineses produzidos em condições sociais/ambientais questionáveis? E a frase “eu sujo!”. Eu uso meu carro a gasolina, eu dou descarga sem me preocupar para onde vai aquilo, eu consumo um monte de porcaria de plástico. De metal também, que precisou de um monte de combustível fóssil para ser produzido, talvez até de carvão do cerrado.....AHHHHHH.......Socorro, será que dá para ser íntegro e honesto estando inserido na sociedade. Quem topa tentar?

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  7. Oi Marcelo, fiquei muito feliz ao ler o seu comentário!

    Eu li pouca coisa do Osho, durante as "buscas da adolescência", mas lembro que gostei muito. Esses grandes Mestres tem muito a nos ensinar. E eu estou tendo o privilégio de ter um mestre vivo e perto de mim (sei que você viveu isso com o Osho, deve ter sido fantástico!). Posso falar, sem medo de parecer exagerada ou "fanática", que devo muito dessas mudanças que você mencionou ao DeRose. Você mesmo me lembrou da frase "quando o discípulo está pronto, o Mestre aparece", e é bem isso, se a gente não se prepara, não tem mestre que dê jeito, então eu reconheço o "meu" mérito, mas ao mesmo tempo tenho um profundo sentimento de gratidão por essa pessoa existir e transmitir toda sua sabedoria, a quem esteja disposto a ouvir.

    E você tem toda razão sobre os roubos que constantemente fazemos à propriedade intelectual (o DeRose fala muito disso, pois muitas vezes a gente não se dá conta de que está roubando o trabalho do outro). Quem não roda uma versão pirata de programa em seu computador? Quem nunca baixou um mp3 ou vídeo da internet?

    O que a gente precisa ter consiciência é que não é ética pela ética. Eu não vou ser boazinha pra "ir pro céu". "Aqui se faz, aqui se paga": chamamos isso de karma, a lei universal de causa e efeito. E também é preciso lembrar que o karma não está ligado a coisas negativas, pois se você desencadeia uma ação positiva, vai ter um retorno positivo também!

    Com relação à sujeira, isso se enquadra em outra norma ética que é a "não agressão". Agredimos o meio ambiente o tempo todo!

    Olha, sinceramente, não sei se é possível viver na sociedade, como ela é hoje, sendo 100% ético... mas a gente "precisa" tentar. Acho que o caminho para não ficar louco é ir incorporando uma coisa de cada vez, ir mudando os hábitos aos poucos e, para aqueles que ainda não conseguimos mudar, buscar medidas que minimizem os impactos. Talvez apoiar instituições sérias que façam trabalhos ligados ao meio ambiente e a causas sociais... só não pode achar que essa é a solução definitiva, tipo: agora eu pago a filiação do Greenpeace e uso meu carro com a consciência tranquila.

    É, cumpadre, temos muito trabalho pela frente ;)

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  8. Adorei e parabéns querida!
    O Não Roubar é até mais sultil do que isso quando anlizado profundamente, mas fico feliz ao ler os demais comentários, pois vc realmente incorporou o Método DeRose ao espalhar Nossa Cultura!

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  9. Obrigada Cá!

    Comecei a ler um livro hoje, por conta da nossa conversa de ontem. Escolhi um do Rubem Alves, que chama "Concerto para Corpo e Alma". Eu já li, mas há bastante tempo. Quando eu leio Rubem Alves fico tão leve, tão feliz, com mais esperança no mundo.

    Segue uma pequena frase, pra compartilhar a alegria de hoje:

    "A sabedoria é a arte de reconhecer e degustar a alegria"

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  10. Carol, parabéns, muito legal suas reflexões e questionamentos. Tem toda a razão em todos os argumentos, só não concordo com "O que o político vai fazer com a verba que tem na mão é problema dele. Ele foi eleito por um sistema democrático, ele representa uma maioria que confia nele". E "a sensação de que eu fiz a minha parte" só nos distancia da verdadeira questão - é mais comodo, mas não a resolve: a impunidade que abunda nesse país. O problema pode (?) ser dele mas o dinheiro NÃO, e se a maioria concorda, a "minoria" não tem q ser penalizada por isso. No entanto, a minoria, nós e alguns outros, reclamamos durante a campanha e depois ficamos 4 anos calados...

    Mas pelo menos tomei uma posição a partir dessa eleição: não quero q ninguém venha me dizer q o(a) eleito(a) é minha representante se não for em quem eu votei. É, sim, constitucionalmente representante do povo, mas não MEU. Tb não mais admito ouvir "cada povo tem o governo q merece". EU não mereço.

    Na verdade, estou cada vez mais de saco cheio e desencantado com tudo q está acontecendo nesse país. Nessa eleição, por exemplo, temos dois "personagens" q se fingem inimigos opostos, mas q acabam propondo (???) basicamente as mesmas coisas, ou seja, somente o q o povo quer ouvir. E depois, na prática, fazem aquilo q realmente querem: aproveitar as benesses do poder. O Serra (e o FHC q, para seu arrepio, eu gosto) há quatro anos tem ferrado outros candidatos q eu considero melhores q ele, batendo o pézinho naquela: "eu quero, porque QUERO, PORQUE QUERO!!!!!". Ferrou os outros e agora será, ao q tudo indica, merecidamente ferrado tb. Afundou o barco dos outros para morrer na praia. A Dilma, notável e notória invenção do Lulla, parece estar lá para ajudar o grande desejo castrista embutido no projeto do PT (latino americano adora uma ditadura) de permanecer no poder ad infinitum. No mínimo, 20 anos: 8 Lulla +4 Dilma + 8 Lulla. Vinte anos? Isso foi o tempo da ditadura militar e não quero pagar isso novamente. Porisso, mesmo a contragosto, votarei no Serra. Pode me xingar, me humilhar e se vingar a qq preço, me adorando pelo avesso...

    Enfim, domingo está logo aí. Que passe logo e q a terra nos seja leve.

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  11. Oi João, muito obrigada por contribuir com a discussão!

    Esse lado "inconformado" realmente anda bem em falta. Por mais que cada um tenha que cuidar da sua vida, não podemos abrir mão da responsabilidade de zelar pelo todo.

    Seu comentário já me fez pensar muito, obrigada mesmo!

    Abraços!

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